Uma cicloficina lá fora: Paris

Paris, conhecida como cidade-luz ou cidade do amor, é também uma cidade de bicicletas. Como seria de esperar, conta com várias cicloficinas. Há quem faça uma diferenciação entre as cicloficinas de Paris (cyclofficines) e o Atelier Vélorutionnaire (ou Vélorution). Esta última possa talvez ser chamada de uma cicloficina engrandecida, uma espécie de versão dois.

Les Cyclofficines

Bem-vindo à Cyclofficine (fonte: http://cyclocoop.org).

Pelo menos em 2017—segundo nos conta o Hugo Charbonnier, um amigo da Fruta Feia—havia duas em Paris e outras duas na periferia (ao que parece, agora são três; uma terá fechado entretanto). Tendem a abrir 2 a 4 vezes por semana. Podem contratar várias pessoas através de contratos parcialmente financiados pelo estado. Este financiamento é visto como uma forma de reduzir a taxa de desemprego, sendo que é essencialmente direccionado a pessoas desempregadas há algum tempo. Claro, também contam com a preciosa ajuda de voluntários que se organizam através de um elaborado calendário.

Página: http://cyclocoop.org

La Vélorution

Em 2014, a Rosa visitou o espaço da Vélorution e trouxe-nos um relato interessante (os números que se seguem datam de 2014). Não confundir com vélorution, o evento mensal que por cá conhecemos por massa crítica. A Vélorution é todos os dias (mas o espaço abre duas vezes por semana). Esta cicloficina é dotada de uma organização mais formal e elaborada. Têm cerca de 3500 membros que pagam uma quota anual de 10€. Os membros são também voluntários que vão duas vezes por semana para ajudar; optaram por não contratar ninguém.

A entrada da Vélorution.

O espaço que usam, a Maison du Vélo, parte de uma iniciativa do município, o qual partilham com outras três ou quatro organizações à volta da bicicleta, que têm objectivos diferentes entre si. Este espaço encontra-se dividido em três ou quatro salas. A maior serve para a cicloficina em si. Outra é usada como armazém para a ciclo e para as bicicletas dos cursos de uma das outras associações. Na Maison há também uma espécie de balcão de informações para quem quer andar de bicicleta por Paris, havendo uma das salas, por sinal com bom aspecto, cheia de brochuras informativas e institucionais, além de mapas. É também nessa sala onde se realizam as sessões teóricas do código da estrada, entre outras actividades educacionais.

O modo de funcionamento parece ser um compromisso entre um sistema de quotas e de free-for-all. Os membros pagam uma quota anual (pelo menos 10€), mas depois não lhes é cobrado mais nada. Sim, mesmo se um membro quiser montar e levar a sua Peugeot para casa não paga mais do que a quota anual. Aqui nota-se um bocado que o modo de funcionamento de uma cicloficina é sem dúvida função do sítio onde existe: com tantos membros a pagar quotas e tantas bicicletas que lhes chegam—mais sobre isso adiante—, torna-se mais exequível a disponibilização gratuita de bicicletas. Isto também se reflecte na possibilidade de ter e manter (i.e,. substituir) ferramentas de marca (VAR e Park Tool), em bom estado, e para todo o tipo de trabalho. Além de permitir oferecer bicicletas, a vantagem pelos números em termos de bicicletas que lhes chegam, também leva a que praticamente não precisem de comprar peças novas, tirando alguns consumíveis (e.g., cabos e calços de travão). Bom, isto também quer dizer que se levanta o dilema sobre o que fazer às bicicletas que chegam quase prontas: se são desmontadas, incentivando mais aprendizagem para quem as quiser montar, ou se são postas a rolar mais cedo. Os membros têm ainda a oportunidade  de comprar peças e ferramentas novas a preço de custo. Assim, o sistema de quotas fica ainda mais fácil de ver como algo vantajoso para todos.

Parece que a Vélorution partiu em parte dos meios de comunicação (ao contrário da revolution, alguns poderão pensar). As condições de que dispõem, principalmente o espaço e os estacionamentos de qualidade à porta, foram conseguidas através de pressão pelos média. Há imensas bicicletas nas ruas, muitas delas abandonadas. Através dos média também conseguiram que a polícia não deitasse bicicletas abandonadas para a sucata. Em vez disso, têm uma parceria para as recolherem na Maison. Também recebem muitos donativos de bicicletas e peças, que também contribuem para a possibilidade de darem bicicletas.

Organização por etiquetas.

Organização por etiquetas.

A sua organização e arrumação das peças e ferramentas é de fazer inveja a muitas cicloficinas. Têm um sistema de etiquetas que permite encontrar facilmente uma peça que se precise. Por exemplo, para montar um selim, procuramos pelas caixas com etiquetas laranjas, encontrando aí selins, espigões, nozes, abraçadeiras, parafusos, enfim, tudo o que é necessário para montar um selim. Esta organização é possível porque é mais ou menos sistemática: duas vezes por ano reservam um dia inteiro para deitar fora peças estragadas e voltar a arrumar tudo no sítio, deixando tudo impecável. Os membros, voluntários ou não, são também convidados a participar nessa limpeza. Ainda parte fundamental da organização, são as reuniões que ocorrem idealmente todos os meses. Tal como a Cicloficina dos Anjos, têm um modelo de hierarquia horizontal, havendo uma constituição formal para poderem ter parcerias institucionais.

Mais fotografias: https://get.google.com/albumarchive/103659487720049138945/album/AF1QipO1aie81dTAHY9SeSP_bMuOHNM8ZnzUrd4m8IkE

Página: http://velorution.org

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